quinta-feira, 29 de novembro de 2018

Demônios nas quatro linhas


Uma máxima da propaganda, o que valeu até a conquista da presidência no Brasil: Personalize! Para um Neoliberal, tudo pode ser vendido. Absolutamente tudo. Seja um objeto ou uma idéia, desde que haja uma cara e uma história. Tudo pode ser lido se tiver uma forma definível. Se falar do MAL, ninguém entende, porque a princípio é abstrato. Mas basta um corpo e dois chifres e casco, e pimba! Aí está seu inimigo! Não precisa se aprofundar no mal, a começar pelo mais difícil, o auto-exame. Freud nunca perdoou a iconoclastia: a não destruição de Deus, mas sim a do demônio, que é uma deidade mais útil. Corremos sempre atrás do demônio, qualquer um, para poder apontar a culpa, de nossas ações e omissões e a custódia de nossos crimes.
A maior final de Libertadores, como apregoavam os grandes diários argentinos, mostrou exatamente a que veio. Em um país também dividido como o nosso, entre direita e esquerda (assim como a contaminação em toda América Latina), tendo seu presidente escolhido um dos lados publicamente, colocou uma lente no que está aparecendo demais nas relações humanas. Ódio, violência e desmedidas. Os ânimos exaltados desde a primeira partida, onde já havia acontecido um adiamento da partida, por conta da meteorologia, mas contou anteriormente com um adiamento, era o prenuncio de algo por acontecer. O jogo quando aconteceu, com um placar razoável, muita garra dentro de campo, violência nas faltas, marca dos jogos sul-americanos. Mas a violência vista na entrada do último jogo, aliada a incompetência do governo e das entidades organizadoras, mostram o retrato social de como estamos nesse continente.   Um vexame. O governo aponta seu próprio demônio para o qual transferir sua culpa, ou pelo menos desconversar.
O confronte era uma boa oportunidade de mostrar o quanto duas equipes importantes são dentro das quatro linhas. Se nem foram respeitadas as torcidas em todo momento até agora, o que diria o espectador internacional, que fica esperando algo acontecer durante quatro horas seguidas de desencontros de informações? Para eles, no mínimo, voltam os adjetivos que possuíamos antes da virada econômica brasileira, de “terceiro mundo”. Essa forma pejorativa, que acompanhou muitas gerações e apenas em um período, tivemos orgulho de sermos grandes, de ter possibilidades de montar uma Olimpíada e Copa do Mundo. Nesse momento, mostramos o quanto interessa que esse estigma volte. As entidades que organizam, não conseguem se impor aos times. Podemos lembrar, que também não podemos apontar o dedo. A final da Sul-Americana do ano passado, houve estádio invadido, bar saqueado, brigas, roubos. Não é exclusividade dos nossos vizinhos. O Mal está aonde? Na ineficiência em identificar quem foram ou de ter uma política de prevenção?
Certamente, em momentos sociais onde está dividido o país, tendo a legitimação de atos de violência, as violências voltam a circular esses ambientes, como vão voltar as manchetes a partir do ano que vem com mais frequência. O que incita os sem-terra é a falta de terra. O enfrentamento, quando não existe vontade política de resolver a situação e sim reprimir, será grande. Em todas as áreas da sociedade, essa violência vai acontecer e estaremos voltando, regredindo à estaca zero. A dívida da sociedade brasileira com a maioria miserável está chegando à sua hora de execução. A violência acaba favorecendo no final das contas a direita, que já entendendo a situação, já entrou com projeto de Lei, proibindo as manifestações. Onde chega, nesse clima de caldeirão e impaciência vivida por este cidadão, o limite humano ao ver a situação precária de sua família? Ou a fome de seus miúdos? E a pregação não é a favor dos saques, mas um ouvido sofrido está predisposto sempre a ouvir o Mal. Basta apenas um gatilho.

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