Acho que vivo em mundos paralelos. Sabia que o ódio estava
presente sempre, mas o caso da Marielle, transbordou a barreira do ponderável.
Como é possível, que uma pessoa que tem ódio a um partido, passa por cima
covardemente da morte de um ser humano, faz pouco caso nas redes sociais,
dissemina inverdades para desqualificar uma pessoa com todas as qualidades e
lutas das minorias e cospe em cima dos Direitos Humanos, sem nem ao menos saber
o que é Direitos Humanos? O que faz uma pessoa odiar tanto a outra pessoa que é
capaz de qualquer barbaridade para se sentir glorificado com suas ações?
A sensação de passar por entre frestas desses mundos sem
poder fazer nada, ao menos ajudar a pessoa a ter no mínimo compreensão da sua
fala é ambígua. Sabemos que se formos atrás de cada notícia, cada desvio de
atenção, qualquer fofoca, onde no Brasil o inconsequente e o essencial se
confundem, não temos tempo de respirar direito e a nos dedicar a outras coisas.
Assim mesmo, sempre seguimos em frente e firmes, com o pensamento incômodo de:
Será que estamos perdendo algum detalhe?
Mas esse modelo fascista que todos estão assustados, que
aparece nas redes sociais de forma brutal, crescente, pondo inclusive um
representante político no páreo da corrida presidencial, foi de uma hora para
outra? Quantas pessoas estão tendo que fazer verdadeiras faxinas de amizade
virtual? E quantos tinham aquele amigo de longa data que de repente está tendo
um discurso diferente do que conhecia anos atrás?
O fascismo é sempre um produto de uma inconsistência
econômica. A inconsistência cria uma necessidade frequente de justiça. A
pressão econômica é grande, o poder de compra encolhe e a sociedade começa a
disputar a quem pertencem o bolo onde está o verdadeiro dinheiro, que vão ficando
cada vez mais difíceis de alcançar. Junto com isso, você percebe um sentimento
de desânimo com seu Estado, seu País. A pessoa se acha inferior, incapaz de
produzir sua riqueza, principalmente vendo que as necessidades básicas estão
cada vez maiores enquanto poucos fazem e desfazem tudo em prol dos seus e de
seus amigos.
Os ânimos ficam exaltados. Tanto a esquerda quanto a
direita vão ficando mais extremadas. O vazio que o centro ocupava dá
lugar para um político novo – Aquele político que você não conhece sua luta
social, mas sim com a promessa de exterminar com as mazelas. Ele pode ser
famoso ou elegante ou surgir como um super-herói da cultura pop americana que soluciona
tudo de maneira rápida, reivindicando ao povo pelo sangue ou por deus. Daí vemos
o renascimento do Nacionalismo. Lembram da apropriação de símbolos nacionais? O
pato amarelo já é uma apropriação indevida, por que não falar em roubada a
imagem do artista plástico holandês Florentijn Hofman.
Esse grupo de pessoas, localizam a fonte de problemas
naqueles que não têm encaixe na sociedade dita de
bem, que são inferiores para eles– às vezes, não apenas moral, mas étnico,
sexual, socialista, comunista – e os apontam o dedo. É muito mais fácil
acreditar que todos os problemas estão neles, que querem destruir sua
sociedade, seu modo de vida. A criação de mentiras a cerca destas pessoas, já
provocam um sentimento de verdadeira crença que mesmo sendo desmentidas, não
trazem de volta aquela revolta dessa turba influenciável. O incrível poder
destrutivo da difamação.
Mesmo sabendo que toda execução
de um político é um ato político, pois matam o corpo físico para tentar matar
tudo aquilo que ele representa também. Mas esquecem que algumas pessoas morrem
para virar heróis e acabam sendo mais fortes, pois dão vozes multiplicadas e Marielle
passou a vida lutando contra o feminicídio, a guerra às drogas, a desigualdade,
e assassinato da população pobre seja ela a população trabalhadora, como
policiais.
Agora vemos a luta da sociedade com
ela mesmo, o momento que Umberto Eco já chamava de Fascismo eterno, onde a
classe média desesperada e precisando de prosperidade, reage ao seu declínio
dando apoio ao ressurgimento do fascismo. E a esquerda? Ela está mais uma vez
dividida, travando uma luta contra si, sem compreender novamente o fenômeno,
sem lutar contra esse extremo. E vamos ver o quanto é cíclico a história da
pior maneira.