quinta-feira, 29 de junho de 2017
Projeto Grafite na Rua
Fui selecionado para fazer um painel no novo túnel Charitas-Cafubá. A arte vai fazer parte deste projeto incrível que engloba a estação das barcas de Charitas de Niemeyer, o projeto do túnel aguardada a pelo menos 40 anos pela população e o novo desenho urbano do local. O projeto de pintura que produzi será mostrada em breve. Aguarde!
Crossdresser
Tathi foi entrando de maneira triunfal, lembrando a Jéssica
Rabbit, com um vestido vermelho longo aberto na lateral e batom combinado
exibindo os lábios carnudos, contrastando com sua aparente preocupação. Sentou
e foi logo exibindo a foto do marido, para tristeza do detetive. Foi logo
descrevendo seus trejeitos, suas manias e que sempre saia com um chapéu panamá
à noite. Dizia que sentia muito frio no couro cabeludo. E ainda esclareceu:
- Doutor, acho que meu marido está me traindo! Quero que você siga ele e quero saber todas as
informações, por mais pérfida que seja!
Impassível com o choro da mulher a sua frente, puxou a foto
para perto de seus olhos, colocou-a em seu bolso, ajeitou a camisa, acendeu um
cigarro preto e logo após, falou de forma incisiva:
- Pode deixar comigo, bebe! Missão dada é missão cumprida.
Enxugando os olhos verdes, engoliu o choro e se levantou
satisfeita e com ar de resignada, sai da mesma forma que chegou.
Uma semana depois, ela recebe o telefonema do detetive, que
já daria sua primeira prestação de contas:
- Minha linda, seu marido passa boa parte da noite na boate Toca
do Tatu.
- Meu Deus! Não!
- Mas não se desespere...tem a parte boa e a ruim.
- Boa e ruim? ...me fale a boa.
- A boa é que ele não está com nenhuma mulher.
- Graças a Deus! E a ruim?
- A ruim é que ele se veste de mulher...
- Meu Deus! ...E sozinho?
- Sozinho.
Ela agradeceu e falou que acertaria no dia seguinte. Depois
que desligou, não conseguiu digerir a informação direito e ligou para sua
melhor amiga Letícia. Letícia sempre foi sua confidente e amiga desde a 5ª
série. Ouvindo seu drama mais recente, dá um conselho inusitado.
- Amiga, Ele não está te traindo, mas está revelando uma
tara que acha que não consegue revelar para você. Você ama ele?
-Sim.
- Eu acho que você podia fazer uma surpresa para ele. Que
tal você vestir as roupas dele? Você mostra que entende a situação dele, sem
precisar discutir nada. Vocês se aproximam e tem uma noite de amor na sala e
tudo fica bem novamente, que tal?
-Será?
- Vai por mim amiga. Vai ser mágico!
À noite chega e na hora que o marido chega, encontra a mesa
de jantar arrumada com candelabros e uma comida refinada. De repente, ouve o
som de Jean Francois Maurice e Maryse com La Rencontre
ao fundo e subitamente surge a esposa toda vestida com um terno escuro, bigode
falso e um perfume masculino amadeirado. Ela vai dançando misturando
sensualidade e algo que viu na internet, tentando não ser muito feminina. O
marido com a boca aberta não consegue dar um pio e ela estimulada por isso,
continua seus movimentos, quando o seu celular tocou. Ela atendeu, com voz
masculina, já incorporada no personagem.
- Alô!
E do outro lado:
- Bebe, se quiser pegar seu marido
no flagra, ele está aqui na boate agora e ainda não trocou de roupa. Pega ele
no flagra!
Ela desliga. Olhou para o marido e
para não entrar debaixo da mesa e chorar, emendou logo:
- Que tal uma disputa de queda de
braço?
quinta-feira, 22 de junho de 2017
Aulão de desenho nas férias
Oficina de férias - Curso de desenho.
3 encontros - 3 sextas-feiras.
Duas turmas:
14:30/15:30
16:00/17:00
10 vagas por turma!
Garanta já sua vaga!
Investimento R$ 180,00
Carismático
O carismático é carismático sem esforço. Ele não precisa ler
algum livro, ver algum filme ou ver algum passo-a-passo no youtube. Ele apenas
é. O carismático descobre seu dom, desde cedo, quando notou que tinha que dar
cola na aula de massinha, no Jardim de infância. Nas festas juninas, O
carismático estava sempre escalado para a barraca do beijo. Era lá que a escola
sempre tinha lucro e salvava o orçamento do mês. Sempre foi tudo muito calmo,
até chegar na adolescência, onde se queixa com seu pai:
- Não quero ser mais carismático!
- Desculpe filho, não entendi nada do que falou. Estava
hipnotizado com seu carisma.
O carismático na rua podia causar verdadeiros transtornos. O
brilho intenso de seu carisma pode levar ao desespero motoristas desavisados e
colisões são sempre comuns em um simples passeio ao mercado. Quando O
carismático precisa fazer sinal para o ônibus, quem está do outro lado acha que
está sendo chamado. Pior para quem sofre de algum problema cardíaco, pois enche
de transeuntes tentando resolver o problema. Agora imagine isso amplificado,
quando O carismático precisa ir a loteria. O rastro de ataques do coração
causados por seu carisma enquanto chega ao local é imensa. O carismático
precisa ter cuidado ao passar por food trucks, porque algumas receitas acabam
sendo reinventadas com o desvio de olhar de seus admiradores, gerando mega
maioneses em um hambúrguer ou azeitona na cerveja. Por outro lado, milagres
podem acontecer como paralíticos que saem das suas cadeiras para tentar abraçar
O carismático ou cegos que voltam a enxergar, pessoa voarem, são muitas vezes comuns. Talvez voar não. Outra coisa boa, pode ser o
convite para ser levado de limusine ao centro da cidade, apenas para dar prazer
de sua companhia ao motorista. Por vezes, quando você está com dores nas
costas, pode se aproveitar dos bancos de couro, mesmo que tenha que ir à casa
de sua tia. Uma procissão sempre se reúne em volta de sua casa, é claro
protegida por cordões de isolamento vermelhos e elegantes. Milhões de flashes
são disparados sempre que chega em casa, mesmo voltando suado da corrida na
praia. A polícia já faz plantão todos os dias para organizar a baderna, já que
a população fica dia e noite de plantão, aguardando um simples aceno ou um
sorriso sutil. Não é incomum palavras de ordem, músicas, mosh e gritos
esganiçados quando O carismático aparecia numa fresta da janela.
Quem pode explicar esse dom? Você não apenas quer ficar
perto do carismático, alguns exaltados querem um pedaço da camisa, outras,
autógrafo nos seios e alguns poucos um cílio já basta. Tudo começou a ficar
mais e mais invasivo, no correr dos anos, quando mesmo ao tomar banho, alguém
surrupia o xampu (que aliás, foi presente da sua tia Ana) como lembrança ou
está escondido na banheira, atrás da porta ou até surge de dentro do vaso (não
me pergunte como). Os anos passam, mas a impaciência cresce e o cansaço toma
conta de seu ser. Não é para menos que O carismático tenha se incomodado com
todo o assédio, pois seria como viver em um Big Brother todos os dias de sua
vida, sem direito a se eliminar quando quisesse. Quantos convites recebeu para
participar de partidos políticos? Inúmeros. Quantas vezes foi indicado para ser
representante de turma? Incontáveis. Quantas vezes foi oferecido abrir uma
igreja? Milhares. Cada vez mais alheio as multidões, foi se tornando um sujeito
recluso. Não dizia seu endereço, não tinha redes sociais nem telefone. Nenhuma das duas situações deixava O carismático feliz.
Cada vez mais recluso, lembrava a figura de Howard Hughes, com
barba por fazer, unhas longas, vestindo pijamas e tendo apenas o espelho como
amigo. Resolveu dar cabo a todo aquele sofrimento. Escreveu uma carta singela e
curta para a quem interessar e se dirigiu ao parapeito do prédio onde morava,
no 23º andar. A aparição levou a multidão a loucura quando descobriu atrás
daquelas vestes que era O carismático. Os gritos de alegria aos poucos se
transformaram em gritos de horror com a queda do corpo ao chão. Tragédia
nacional. Luto de três dias. O Papa escreveu uma homenagem, mas não conseguiu
chegar ao fim do texto, debulhado em prantos comoventes. Do outro lado da vida,
Deus não permite a entrada de um suicida em sua casa, por mais dor no coração
que estivesse e de acordo com sua Lei, foi enviado ao inferno, aos cuidados
direto de Lúcifer. Temendo o pior, O carismático, estava pronto para encarar
seu sofrimento eterno. Frente a frente com o capeta, O carismático começa a
falar:
- Estou pronto para encarar meus erros...para que essa
câmera?
O próprio Coisa Ruim abraçou O carismático e fazia uma
selfie, quando vários pequenos diabos reconheceram a figura que acabara de
chegar e começaram a amontoar aos montes, venerando a luz do carismático.
Agora, teria que encarar pela eternidade a bajulação e veneração do outro lado
da vida.
quinta-feira, 8 de junho de 2017
A desempregada e o Circo
Chris Adibê era uma dessas pessoas determinadas, cuja
vocação era nunca deixar a peteca cair. Arquiteta de formação e guia de turismo
por vocação, acabou passando por aquela fase em que todos estão experimentando
no momento de crise aguda: o desemprego. Passou grande parte dos seus três
meses de folga forçada, enviando e-mails, visitando grupos de oportunidades no
Facebook, procurando chances no WhatsApp e um belo dia, ei-la aceitando uma
vaga inesperada em sua vida: Artista de circo. O que iria perder? Com vale
transporte, alimentação no local, treinos e convivência com pessoas com
sentimentos livres. Parecia ser bom, apesar de não ter nenhuma idéia do que
poderia fazer. Aliás, nunca foi dada ao mundo das artes, apesar de lembrar de
ter feito uma ponta de cobrador de presença, numa peça de teatro da 5ª série,
em sua antiga escola. No dia seguinte, tomou seu tradicional café com leite e
um pedaço de costela, e após um grande suspiro, foi decidida a mudar de vida. O
mais importante, era focar na idéia que precisava quitar meses de aluguel
atrasado. Foco! A visita ao circo Gran Orlando, foi emocionante e foi recebida
de braços abertos pelo dono e apresentador do espetáculo Seu Alfredo.
- Meu nome é Chris Adibê Soares Lima. Adibê em homenagem a
minha avó mineira. Vim fazer um teste para trabalhar no Circo. Fui indicada
pela Marcinha...
- Sim, sim! A Marcinha. O que você sabe fazer exatamente?
- Para falar a verdade, posso fazer qualquer coisa. Afinal,
sempre fui boa em Educação Física. Nunca trabalhei no Circo, mas estou
precisando de uma chance urgente e estou muito desesperada...posso fazer a
assistente do mágico, que tal?
- Impossível, querida. Ontem, durante o espetáculo, ele fez
seu grande número de serrar ao meio uma pessoa da plateia. Até agora ele está
no hospital tentando juntar as partes de uma senhora da plateia. Os coelhos
ficaram aqui para receber os recados e os pombos estão dando o depoimento na
polícia, mas o delegado já falou que não quer saber de pessoas avoadas
prestando esclarecimento no inquérito levantado pela família.
- Entendo...então que tal trapezista. Poderia me balançar a
20 metros de altura.
- Tenho uma notícia muito triste. O trapezista faleceu.
Ontem, anunciou ao público que iria fazer um salto mortal. E foi mortal! Que
homem de palavra...
- Jesus! E todo mundo viu ele se espatifando no chão?
- Claro que não! Ele deu um salto direto em um balde dágua!
- Minha nossa!
- Minha Nossa digo eu! Esqueceram de colocar água...
- E o engolidor de espadas? Que tal eu segurar as espadas
para ele?
- Ontem, depois de engolir 7 espadas, não conseguiu engolir
o desaforo de uma pessoa da plateia e do jeito que estava partiu para cima do
infeliz com ódio no coração. Acabou passando mal e foi levado ao hospital.
Nesse momento deve estar na mesa de operações, afinal, certas
coisas só são amargas se a gente as engole...
- Nossa...parece até sabotagem. E
que tal o homem forte? Poderia ficar ao lado dele de maiô. Tenho um corpo
bonito.
- Isso vai ser complicado...o
homem forte na verdade é a biba forte. Da irmandade. Não tolera mulheres a pelo
menos 10 metros de distância. Certa vez, uma foi ver a apresentação na primeira
fila. O homem forte deu um chilique tão grande, que ficou desacreditado e saiu
do picadeiro na mesma hora. Até hoje está trancado no seu trailer, com trauma e
chorando muito. Estamos mantendo ele a base de chocolates e maratona de Mother
Family.
- Já sei! Já sei! O que realmente o Circo está precisando é
de um dono do circo! Esse é a ocupação que devo ter neste trabalho!
No dia seguinte, Seu Alfredo estava começando a enviar
e-mails, visitando grupos de oportunidades no Facebook, procurando chances no
WhatsApp...
quinta-feira, 1 de junho de 2017
Vai subir!
Lembro a época em que os elevadores pantográficos tinham que
ter um ascensorista. Conheço lugar que você tem que desafiar a morte nas portas
assassinas ou de ataque de coração. Já Subi em um que deixou a minha pressão lá
no subsolo mesmo. Não sou contra elevador ou qualquer tipo de elevador. Muitas
das vezes prefiro as escadas mesmo. Não me venham com Transtorno obsessivo ou
claustrofobia. Não é o meu caso, juro. Quero focar na figura do ascensorista.
Esta pessoa que era presente em muitos elevadores e foi se extinguindo aos
poucos, sendo trocado por TVs frias e gente que compartilha seu momento de
espera até o andar desejado. Tenho na minha memória pessoas muito educadas, que
puxavam assunto – Não importava qual – e deixavam esse momento de espera mais
caloroso. Possivelmente falariam hoje:
- Você viu a falha do Muralha no jogo de domingo?
- Tá armando um temporal feio, hein?
- Esses moços, pobres moços / Ah! Se soubessem o que eu sei /
Não amavam, não passavam
Aquilo que já passei / Por meu / olhos, por meus sonhos Por
meu sangue, tudo enfim É que peço
A esses moços / Que acreditem em mim... (cantoria de uma
música de Lupicínio Rodrigues)
Saudades, viu? Cada vez sinto saudades do contato das
pessoas nas ruas. Não é implicância, é posição crítica. A escada é ótima, mas
não conversa. Não gosto de uma voz metálica dando palpite no meu trajeto. Lembro-me
de um sujeito que trabalhava no centro do Rio. Se chamava Almir. Um velhinho
boa praça que sempre dava bom dia a todos e ficava lendo seu jornalzinho a
medida que o elator subia. Mas o mais intrigante, era que ele usava dois
jargões no meio de uma conversa, que acabava resumindo tudo que havia sido
falado. Hoje, teríamos os seguintes diálogos:
- Cada dia a situação só piora e pelo visto vai piorar, não
vejo nada positivo com alguns, tenho muito medo do futuro do país, espero que
esteja tudo melhorando, fazendo essa faxina do judiciário nos políticos. Será que teremos alguma luz no fim do túnel?
- Vai descer! – Gritava Seu Almir
- Alô Mírian? parabéns anja, te desejo todas as coisas boas
que existem nesse mundo, espero que teu dia seja incrível!! Te amo bonequinha!!
Um beijo da sua tia! Espero que tenha muitos anos de vida!
- Vai subir! – Gritava Seu Almir
- Tô na dúvida entre pedir um tênis ou investir na bolsa no
dia dos namorados. Um tênis vou ficar muito feliz por um tempo, mas e se a
bolsa crescer, poderia comprar 20 tênis e ficar anos feliz. Será que vai
acontecer com o índice da bolsa?
- Vai subir! – Gritava Seu Almir
- ...Eu beijando ele muito e o clima crescendo. Não rolou
nada, mas hoje vai ter um jantarzinho chique que ele tá programando. O problema
é que ele vai ter um dia estressante no trabalho e trampar de 6 da manhã até ás
8 da noite...será que vai dar conta de mim? Será que ele pega fogo?
- Vai descer! – Gritava Seu Almir
Era ótimo. Parecia um quadro de humor do Jô Soares. Infielmente
esse tempo acabou e temos que encarar que elevador é uma caixa mecânica que tem
ALARME escrito bem grande e outras indiretas para transformar no meio de
transporte mais seguro do mundo. Bravateiros irão falar que os tempos de
modernidade exigem que sejamos cada vez mais a tecnologia vai ditar as regras,
mas sabemos que a verdade é que o capitalismo tirou essas vagas para a
automação. E no fim das contas, a individualidade cresce mais a cada dia. Quem mais poderia indicar onde estarão as
lindas beldades, no 23º ou no 24º andar? Ou onde está um WIfi gratuito?
Por tudo isso, não me nego a entrar em um elevador, mas
apenas sinto um profundo suspiro ao olhar para o local que antes era reservado
ao querido funcionário da berlinda e ver APERTE AQUI.
Mas uma sensação que muitos já passaram é ficar preso em um
elevador. Preso com outras pessoas, sendo uma delas desesperada em um calor
infernal, esperando socorro com um apito de emergência por longos minutos. Nada
é mais sufocante e desesperador.
Aparentemente ficar a muitos metros de profundidade em uma
gaiola para ver um tubarão é bem pior do que ficar preso no elevador.
Aparentemente.
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