Gambitos no xadrez, significa você sacrificar peças menores
para pegar as maiores. Esse termo sempre me vem à tona, quando somos acometidos
por tragédias. Sempre após mortes e destruição, é que se endurece, criam-se
leis e arranja-se verbas do nada para cobrir os danos. Nunca se pensa em
prevenção. Nunca se pensa no bem comum. O dinheiro fala mais alto sempre. Como
no caso de Brumadinho, em que prenderam a parte mais frágil da corda, para
saciar a sociedade, mas justamente esses presos, que foram engenheiros que
assinaram laudos corroborando a segurança da barragem, foi coagido pela
empresa. Além disso, deputados afrouxam as leis para vistorias, se faz
contenção com preços mais baratos possível, então as irregularidades são
cometidas de cima para baixo, mas nunca serão atingidos, pela proximidade com o
poder.
A verdade é que entra governo e sai governo, a situação das
enchentes devidos as chuvas, não para! O Rio de janeiro, foi construído em
grande parte nos mangues e ocupação do solo desordenada. As condições
urbanísticas derivado de uma composição medieval, as tubulações arcaicas e o
lixo acumulado também não ajudam. Todo ano, no período mais intenso de chuvas,
a situação se repete. E todo ano, os governantes repetem as desculpas falando
que investem milhões em prevenção, mas não foi possível evitar a tragédia.
Faz 53 anos, que tivemos uma das piores enchentes na cidade
com 250 mortes e 50 mil desabrigados. A cidade ficou sem água, energia e
sistema de transporte. Foram feitas prevenções desde então? Não. Aliás, temos
registros de enchentes desde séculos passados. Em 1711, um sítio foi
completamente inundado e o caos se instalou na cidade. Em 1756, depois de três
dias de temporal, canoas eram o meio de transporte mais usado; em 1811 a chuva
foi tão forte, que desmoronou uma parte do Morro do Castelo e em 1987 os
desmoronamentos na Região Serrana fizeram o Estado decretar pela primeira vez
Estado de calamidade pública.
Eu tive a experiência terrível com a chuva de 2010. Comecei
a pegar a chuva na descida de Petrópolis para o Rio, que foi bastante forte,
mas não tinha a noção real do que ainda estaria por vir. Chegando em Niterói,
como a chuva estava fraca, aproveitei para fazer as compras da semana. Ao sair,
não tinha notado o quanto tinha vindo aquela tempestade no tempo em que me
entretinha com o setor alimentício. Encontrei o caos, como nunca tinha visto na
vida. Ruas com águas até o meio dos carros, rotas de trânsito desrespeitadas,
destruição nas ruas com árvores caídas. Minha saída foi ir para um lugar plano
e longe de tudo. Fui para São Francisco e fui jantar no único bar funcionando.
Nesse momento, parado e vendo o cenário ao redor, com enchentes,
transbordamento de rios, explosões de energia, falta de luz e gritaria é que
tive uma pequena noção. Tentei por duas vezes voltar para casa, mas foi
impossível e tive que dormir no carro. O detalhe era que iria fazer um bolo
para antecipar o aniversário de minha filha. Não aconteceu. Por sorte, se a
madrugada precisasse de água ou comida, eu teria. No retorno para casa, no dia
seguinte, vendo o rescaldo na minha cidade, é que vi a notícia da queda do
morro do Bumba, que vitimou em 264 mortos.
Tiramos alguma lição dessas tragédias todas. Não.
Continuaremos com problemas hoje, amanhã e depois de amanhã. Estudos, prevenções
e alertas são sempre ignorados e só chegam ao público, no momento da tragédia,
para mostrar o quanto foi omisso o governo em não evitar as mortes. Depois de
cada tragédia, vem a segunda tragédia de enterrar os mortos e dar assistência
social aos desabrigados, que no histórico é postergado ao máximo, enquanto para
essas pessoas o sofrimento continua até a próxima crise.
Deixo minha solidariedade aos atletas jovens do Flamengo,
que tiveram suas vidas ceifadas pelo fogo e que de enchente, foram as lágrimas
que caíram sobre minha face por mais um descaso.
Nenhum comentário:
Postar um comentário