Era uma vez... uma lebre e uma tartaruga.
A lebre era um grande empresário, trabalhava no maior prédio
de Botafogo. Possuía uma Ferrari F458, um tríplex em Ipanema, um Moto Z
Play, uma Harley-Davidson 1915 11F e de quebra, viaja todo ano para a Europa. O
tempo era corrido para a lebre. Não tinha tempo para seus filhos. Sua
ex-mulher, quando levava suas crias para o seu final de semana SIM, muitas
vezes tinha que pegar mais cedo, levando a Lebre-fêmea a ter que desistir de
vários compromissos e com isso, lavando ao tribunal por negligência. Nada que
tirasse a lebre de seu foco empresarial, conservador e cristão. Por conta de
delações premiadas, seu nome foi jogado para a imprensa e o nervosismo toma
conta do seu ser.
A tartaruga, mais humilde, está passando por um momento
difícil. Desempregada, está enviando currículo a pelo menos dois meses. Apesar
disso, divide o pouco que tem, na participação do coletivo de caridade que tem
em seu bairro. Não deixa de participar do churrasco dos amigos, onde não
colabora no racha das despesas, mas é presente no preparo das carnes.
Vegetariano, não se opõe em trabalhar com churrasco, mas faz questão de
encontrar com os amigos. Apesar de ter casa própria, se preocupa com o bem-estar
de todos seus amigos.
A lebre vivia caçoando da lerdeza da tartaruga.
Toda manhã, os dois se encontravam no cruzamento
da Uruguaiana com Alfândega. Ele na sua imponente Ferrari e ele no seu modesto
Volks 97. A lebre aproveitava suas frustrações e raiva, naquele momento,
naquele perímetro e sabendo que a tartaruga demorava 3 minutos para começar a
retrucar, aproveitava e partia quando o sinal abria no verde, fazendo aquele
barulho característico de quem pode acelerar de 0 a 100 em segundos. Quando
conseguia pronunciar a primeira palavra já ouvia o som das buzinas clamando
para que andasse...nunca a tartaruga lhe dirigiu a palavra. Por que isso
acontecia com frequência?
Quem tem pressa quer sempre acabar com quem está na frente
devagar. Isso é chamado de síndrome senhor volante. Pode ser aplicada também
para aqueles senhores andantes nas ruas. Somente quem teve Chycungunya e fica
na situação inversa pode entender como os apressadinhos se sentem, mas e o
enfermo? Ninguém quer pensar nele.
Certa vez, a tartaruga já muito cansada por ser alvo de gozações, decidiu desafiar a lebre para uma corrida. Não de carro, pois a diferença era muito grande. Uma corrida a longa distância a pé, como nos clássicos da Grécia antiga. No dia seguinte, no encontro das ruas, como de habitual, a lebre foi caçoar da tartaruga, quando esta entregou seu desafio por escrito. Letra de forma, com horário, dia e prendas e ganhos, respectivamente ao perdedor e ganhador. Lendo aquilo rapidamente, deu de prontidão um pequeno sorriso no canto da boca.
A lebre muito segura de si, aceitou prontamente.
No dia e hora marcados, os dois estavam lá. Não
perdendo tempo, a tartaruga pôs-se a caminhar, de forma lenta, porém, firmes. Logo a lebre ultrapassou a adversária, e vendo que ganharia
fácil, fácil, parou e resolveu olhar a bolsa de valores através do celular.
Empolgada com o pregão e seus administradores do outro lado da linha, não viu a tartaruga que a ultrapassou e começou a
correr.
Na reta final, viu finalmente a sua adversária cruzando a linha de chegada, toda sorridente. A tartaruga ganhou a Ferrari da lebre e a lebre deveria usar seu Volks antigo. Agora, todos os dias, os dois se encontram no cruzamento. A tartaruga não precisa dizer nada a lebre que tendo como prenda usar o carro por pelo menos 10 anos, também não se dispõe a cruzar olhares. A única liberdade da tartaruga é acelerar de 0 a 100 quando o sinal abre, deixando o buzinaço para seu colega fitness, a lebre.
Moral: Não faça do
seu carro uma arma, a vítima pode ser você.